O presidente do Sindicato dos Médicos do Estado de Sergipe (Sindimed), Dr. Helton Monteiro, participou, na tarde dessa segunda-feira, 10, como palestrante da audiência pública realizada pela Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados, que debateu o tema “Terceirização e vínculos precários e seus impactos na saúde”. O encontro, realizado no Plenário 7 da Câmara Federal, em Brasília, foi convocado por meio de requerimentos de autoria do deputado Jorge Solla (PT/BA), com o objetivo de promover um amplo debate sobre os efeitos da terceirização no sistema público de saúde brasileiro.
Durante sua apresentação, Dr. Helton Monteiro, que também é diretor da Federação Médica Brasileira (FMB), fez um diagnóstico contundente sobre o processo de precarização que avança na saúde pública desde a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017). Segundo ele, essa legislação abriu caminho para um modelo de contratação que fragiliza os profissionais e destrói o sentido do serviço público. “Crescem os contratos PJ, as sociedades de cotas, os vínculos irregulares. Médicos e profissionais da saúde estão hoje sem direitos, sem garantias, sem estabilidade. Vivem à margem da lei, num sistema que os explora e os descarta”, afirmou.
Como exemplo, o presidente do Sindimed relatou o caso do município de Canindé de São Francisco, onde o sindicato, em conjunto com o Conselho Regional de Medicina (CRM), realizou fiscalização no Hospital de Pequeno Porte Haydée de Carvalho Leite Santos. A inspeção constatou médicos sem receber salários de setembro e outubro de 2024, pagamentos sendo feitos via PIX, sem contrato formal, e condições de trabalho precárias. Após o período eleitoral, houve demissões em massa, restando apenas duas servidoras concursadas. “As mesmas condições se repetem em municípios como Riachão do Dantas, Lagarto e Carmópolis, onde o modelo de terceirização se impõe como sinônimo de desrespeito e desordem”, afirmou.
O líder sindical também destacou o colapso da Maternidade Lourdes Nogueira, sob gestão do Instituto Nacional de Tecnologia e Saúde (INTS), marcada por atrasos salariais, falta de insumos, estrutura precária e demissão arbitrária de médicas neonatologistas. “O caos que se instalou ali é o retrato fiel do que significa entregar a saúde pública às mãos das Organizações Sociais. O resultado é a precarização total da estrutura e do trabalho humano”, enfatizou.
Outra denúncia apresentada foi a de irregularidades graves no Hospital da Criança, administrado pela Irmandade Boituva de Saúde e Educação, que quarteiriza contratações por meio de uma empresa fantasma registrada em São Paulo. “O endereço oficial da contratada era um outlet de frutos do mar. Fomos pessoalmente ao local e comprovamos a fraude”, relatou o presidente, exibindo parte do vídeo investigativo produzido pelo sindicato.
Em sua exposição, Dr. Helton ainda alertou que cinco Organizações Sociais operam atualmente em Sergipe, todas com histórico de investigações em outros estados: o INTS, alvo da Polícia Federal na Bahia; o IGH, investigado em Goiás; o IGC, cujo presidente responde por improbidade; a Irmandade Boituva, envolvida em contratações de empresa com sede duvidosa; e o IDEAS, investigado por desvio de R$ 196 milhões em Santa Catarina. “Mesmo com esse currículo, continuam administrando hospitais e maternidades em nosso estado”, observou.
O presidente do Sindimed classificou como o “cúmulo da precarização” o caso da tentativa de estupro sofrida por uma jovem médica na UPA Padre Almeida, na Colônia 13, em Lagarto, em setembro deste ano. Segundo ele, após o crime, a gestão da unidade teria tentado impedir o registro do boletim de ocorrência e, posteriormente, demitiu a profissional. “É inaceitável. Médicos e médicas não podem trabalhar sob o risco constante da violência, sem segurança e sem amparo. O que estamos vivendo é a banalização da dignidade”, declarou.
Ele ainda fez um apelo por transparência e controle social, destacando a necessidade de investigar a fundo o modelo da pejotização médica.
“A sociedade precisa saber o que está acontecendo nos rincões do país. Há médicos com salários atrasados, sem férias, sem 13º, sem direito à estabilidade, submetidos a contratos abusivos e ameaças veladas. Me espanta que não haja sequer números oficiais sobre quantos médicos hoje trabalham como PJs no SUS, quanto custam aos cofres públicos e sob quais condições atuam”, disse, complementando, em tom crítico, o impacto da abertura desenfreada de escolas médicas privadas, que, segundo ele, transformaram a formação médica em um negócio.
“Essas instituições se beneficiam do SUS para formar seus alunos e ainda lucram com isso. Muitos jovens médicos se formam já endividados, e, para sobreviver, se submetem a esse tipo de assédio disfarçado de oportunidade”, lamentou.
O presidente encerrou sua fala conclamando o Congresso e as entidades médicas a debaterem uma carreira pública nacional, estável e valorizada para os profissionais de saúde. “O que queremos é o básico, carreira, concurso e dignidade. Essa é a única via para garantir à população um SUS forte, humano e verdadeiramente público”, concluiu, endossando críticas à PEC 38/2025, chamada Reforma Administrativa, a qual ameaça desmantelar o regime dos servidores públicos, destruindo carreiras e direitos. “Um ataque direto à estabilidade, à meritocracia e à independência do serviço público”.
Participação
A audiência contou ainda com a presença do diretor do Sindimed, Dr. Brunno Góes, e de representantes de diversos sindicatos e instituições médicas do país, como o Simers (RS), Simesp (SP) e SindMedABC, além de autoridades do Ministério da Saúde, EBSERH, Fundacentro e Ministério Público de São Paulo.
Por Joângelo Custódio, assessoria de Comunicação Sindimed.
Fotos: Joyce Mattos