Notícias 04/07/2025

Reforma da Previdência da prefeita Emília: ataque brutal aos direitos dos servidores públicos de Aracaju


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Enquanto Aracaju ainda se ajusta aos rumos de uma gestão recém-empossada, a Prefeitura escolhe iniciar sua trajetória política com um gesto que fere de forma profunda o funcionalismo público: a apresentação da chamada “Reforma da Previdência Municipal”. Encaminhado pela prefeita Emília Corrêa à Câmara de Vereadores, o Projeto de Lei Complementar (PLC) representa um verdadeiro desmonte dos direitos adquiridos ao longo de décadas pelos trabalhadores e trabalhadoras do serviço público. O texto, cuja votação está prevista para a quinta-feira, 10 de julho, promove não apenas o aumento da alíquota de contribuição previdenciária, mas a aniquilação simbólica e material de garantias históricas, entre elas, o fim da aposentadoria especial por insalubridade.

Sob o pretexto de atender a uma exigência do Supremo Tribunal Federal (STF), que de fato determinou que estados e municípios adequem suas alíquotas previdenciárias ao mínimo de 14%, conforme a Emenda Constitucional 103/2019, a Prefeitura de Aracaju aproveita-se de uma determinação técnica para embutir um pacote de maldades inspirado na famigerada Reforma da Previdência do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, cujo legado foi a institucionalização da desigualdade e o aprofundamento da insegurança para quem vive do próprio trabalho.

“Esse projeto é uma bomba-relógio contra o futuro dos servidores públicos de Aracaju. Ele aumenta a contribuição, reduz o benefício e amplia a idade mínima. É a fórmula perfeita para esvaziar qualquer expectativa de uma aposentadoria digna”, afirma o presidente do Sindicato dos Médicos do Estado de Sergipe, Dr. Helton Monteiro. Para ele, é inaceitável que, após um reajuste salarial pífio de 6,26% em junho, o Executivo Municipal volte à carga com uma proposta que resultará, na prática, em desconto nos salários e perda real de poder aquisitivo.

O PLC em questão atualiza a alíquota de contribuição previdenciária de 11% para 14% para servidores ativos, inativos e pensionistas. Na tentativa de dourar a pílula, a gestão anuncia um reajuste de 3% nos vencimentos, sugerindo que isso compensaria o aumento do desconto. No entanto, os números não se sustentam nem sob a lógica mais elementar da matemática financeira.

“Para que o aumento da alíquota não representasse perda salarial, o reajuste teria de ser de aproximadamente 3,49%. Ou seja, ao conceder 3%, a prefeitura está produzindo um decréscimo líquido nos salários. Uma fraude matemática, um truque de ilusionismo contábil, um atentado contra a inteligência e o bolso dos servidores”, endossa de forma contundente o secretário-geral do Sindimed, Dr. João Augusto, que vai além: 

“É um erro básico para quem sabe matemática, o secretário de Finanças que assessora a prefeita com certeza sabe. Isso demonstra que não houve uma análise contábil real, mas sim um copia e cola da Reforma de Bolsonaro, com algumas pioras, achatando ainda mais as futuras aposentadorias”, complementa. 

Ainda segundo João, além do confisco previdenciário, o projeto de Emília Corrêa introduz um novo marco de desigualdade social, ao propor o aumento da idade mínima para aposentadoria de 60 para 65 anos, um desestímulo cruel para categorias que enfrentam jornadas extenuantes, como os profissionais da saúde.

Entre os ataques mais graves, destaca-se o fim da aposentadoria especial por insalubridade. Essa conquista, garantida constitucionalmente, assegurava aos profissionais expostos a riscos biológicos, físicos e químicos, como médicos, enfermeiros, agentes de saúde, garis e servidores da limpeza urbana, o direito a se aposentarem mais cedo, como forma de compensar o desgaste precoce do corpo e da mente. Agora, sob a nova proposta, esses trabalhadores serão nivelados por baixo, sem qualquer consideração pelas peculiaridades das suas condições laborais.

Mais crueldades

Para além da crueldade dos índices e do fim de direitos, há problemas estruturais gravíssimos, como explica o advogado do Sindimed, Dr. Thiago Oliveira. Segundo ele, a proposta vai muito além do aumento da idade, da contribuição e da extinção da aposentadoria especial: ela altera de forma dramática a fórmula de cálculo dos benefícios. 

“A Prefeitura está importando a lógica do regime geral da Emenda 103, que aplica 60% sobre 100% da média das contribuições e só acrescenta 2% por ano a partir do 21º ano. Isso significa que um servidor só terá direito a 100% do benefício se trabalhar por 40 anos. É o esvaziamento completo do direito à aposentadoria integral”, afirma.

Mais grave ainda é a questão dos fundos previdenciários municipais. O projeto prevê uma reestruturação que, embora camuflada sob o nome de “fusão”, configura uma segregação de massas sem transparência jurídica. 

“Hoje, quem entrou depois de 2001 está no fundo de capitalização. Os demais estão no fundo financeiro e previdenciário. Com a proposta, a Prefeitura pretende jogar no fundo de capitalização todos os servidores de 1987 até 2025, justamente o fundo que hoje apresenta superávit de R$ 30 milhões mensais e já acumula mais de R$ 2 bilhões em patrimônio. Ou seja, eles querem cobrir o rombo do fundo financeiro com os recursos acumulados pelos trabalhadores do fundo capitalizado. Isso é política pública sendo feita com dinheiro do servidor”, denuncia Thiago.

Na prática, a medida compromete a sustentabilidade do fundo que deveria garantir o pagamento das futuras aposentadorias. “Se esse fundo passar a ser usado para cobrir rombos criados por má gestão, não há qualquer garantia de que continuará superavitário. É um risco imenso. Hoje se arrecada R$ 30 milhões, mas se o município passa a transferir R$ 15 ou R$ 20 milhões para cobrir outro fundo, está usando patrimônio do trabalhador para encobrir falhas estruturais do sistema anterior”, reforça.

Outro ponto alarmante, de acordo com o advogado, é que a proposta não prevê nenhuma regra de transição. “Nunca vi uma reforma previdenciária que não traga normas de transição. É de uma crueldade sem precedentes. Servidores a dois ou três meses de se aposentar terão de esperar mais cinco, sete anos. E isso pesa sobretudo sobre as mulheres, que sairão de 55 anos para 62; os homens, de 60 para 65. É perverso, desumano e inconstitucionalmente questionável.”

Por fim, Dr. Thiago também alerta para uma manobra fiscal que favorece a prefeitura em detrimento do servidor: “No regime federal, ao subir a alíquota de 11% para 14%, o governo federal aumentou sua própria contribuição para 28%. Aqui em Aracaju, a alíquota patronal permanece em 22%. E mais: ao transferir servidores do fundo financeiro para o de capitalização, o município reduz sua base de cálculo para o aporte suplementar, diminuindo o quanto investe com recursos próprios. Ou seja, com uma canetada só, reduz o esforço fiscal da Prefeitura e joga todo o peso do ajuste sobre o trabalhador”, observa.

Para as entidades sindicais, é uma reforma construída sem escuta, sem debate e sem negociação. Esse é o pano de fundo político da proposta. O projeto chegou à Câmara sem tempo hábil para leitura e análise aprofundada por parte dos sindicatos e sem qualquer abertura para diálogo real. O governo municipal, que alardeava a criação de uma “Mesa de Negociação Permanente”, desfez-se desse compromisso logo no primeiro grande embate com os trabalhadores. Não houve audiência pública. Não houve transparência. Houve apenas a pressa do rolo compressor.

Audiência pública e assembleia geral

Como parte das ações de resistência, está confirmada para a quarta-feira, 9 de julho, no plenário da Câmara Municipal de Aracaju, a realização de uma audiência pública que reunirá vereadores e representantes das entidades sindicais do funcionalismo municipal. O momento será essencial para que os sindicatos apresentem, de forma contundente, os inúmeros prejuízos embutidos no Projeto de Lei Complementar (PLC) e para que os parlamentares ouçam diretamente aqueles que serão impactados pela proposta.

No mesmo dia, será realizada uma assembleia unificada dos sindicatos do serviço público, com indicativo de greve geral, a partir das 8h. A mobilização ocorrerá em frente à Câmara Municipal e pretende enviar um recado aos vereadores e à sociedade: os servidores não aceitarão retrocessos nem ataques aos seus direitos históricos.

O Sindimed defende que qualquer proposta de alteração no regime previdenciário deve passar pelo crivo do debate democrático, com escuta qualificada das entidades sindicais e análise técnica transparente. Não é admissível que reformas com impacto direto na vida de milhares de trabalhadores sejam tratadas com tamanho autoritarismo e superficialidade.

“Ao tentar esconder uma medida impopular sob a capa da legalidade técnica, a Prefeitura de Aracaju comete um erro político grave: subestima a consciência e a capacidade de mobilização dos servidores públicos. Esta reforma, como está posta, representa o desmonte do presente e o confisco do futuro”, conclui Dr. Helton Monteiro.

Por Joangelo Custódio, assessoria de Comunição Sindimed. 

Foto: Divulgação/Internet